domingo, 6 de abril de 2008

Se ele se foi, não vale apena voltar, pois junto virão os erros de antes.

Quando se flagrar idealizando o ex, lembre-se do que levou à separação...


Num momento de crise, é natural que façamos comparações entre o relacionamento atual e o anterior. Devemos tomar muito cuidado, contudo, para não ficar nos lembrando apenas dos aspectos positivos do amor antigo, enquanto valorizamos somente os negativos do atual. Essa visão distorcida da realidade nos impede, naturalmente, de agir de maneira imparcial e justa.
por Célia Horta*



Quando a relação não vai bem, é comum que venham à mente de algumas pessoas lembranças de bons momentos vividos com um “ex-amor”. Embora sejam agradáveis, essas recordações muitas vezes se tornam perturbadoras, pois geram inevitáveis questionamentos: “Será que fiz bobagem? Será que deixei ir embora a minha felicidade, o meu verdadeiro amor?” É claro que não existe problema em recordarmos nossa história de vida.
E também é natural e até produtivo que questionemos nossas relações. Reflexões sobre o que está bom no relacionamento, o que incomoda e o que pode ser modificado para melhorálo muitas vezes mobilizam importantes mudanças individuais e do casal. A dificuldade surge quando, de repente, as lembranças boas de um antigo romance, e só elas, se tornam recorrentes, enquanto as vivências desagradáveis, que talvez contribuíram para o final da relação, são minimizadas ou totalmente esquecidas.
O quadro descrito acima merece cautela. Quando pensamentos do tipo “ele era tão legal” ou “eu era mais feliz com ela” insistem em nos assaltar, é hora de buscar uma “observação panorâmica” da situação. Isso não é tão fácil, já que o envolvimento emocional dificulta um “olhar de fora”. Mas é o único jeito de evitar a idealização, pois, quando encaramos apenas um lado da moeda, a imagem que obtemos é sempre parcial e comprometida. Trata-se, na verdade, de um mecanismo de defesa.
Para lidar com a ansiedade e evitar uma dura experiência de frustração, o ego recorre a um jeito de olhar as coisas de modo que a realidade não é percebida de maneira objetiva. Nessa situação, as emoções em relação às pessoas se tornam extremas e elas passam a ser vistas só em seus aspectos positivos ou nos negativos. Na crise conjugal, quando um ex-amor teima em rondar a mente, é possível que o relacionamento atual esteja sendo sentido apenas como ruim e perturbador, enquanto o antigo se mantém sempre como bom e idealizado.
Tal experiência emocional independe da proximidade física com o ex, mas há casos em que a sua presença colabora para a idealização. São situações em que o antigo amor reaparece e, estando ou não com outra pessoa, se comporta de maneira cordial, gentil e, às vezes, até sedutora.A canção
Todo o Sentimento, de Chico Buarque (63) e Cristóvão Bastos (60), trata dessa idealização de um amor antigo que já significou sofrimento: “Depois de te perder/ Te encontro, com certeza/ Talvez num tempo da delicadeza/ Onde não diremos nada/ Nada aconteceu/ Apenas seguirei, como encantado/ Ao lado teu”. Caso esteja vivendo essa atmosfera, procure se lembrar do relacionamento antigo com imparcialidade. Se apenas as recordações boas o invadem, converse com aquele confidente que acompanhou a deterioração da relação.
Talvez ele possa funcionar como uma memória auxiliar, que lhe traga diferentes facetas daquela união. A ajuda pode servir até que você tenha condições de perceber que os flashes prazerosos do passado, quando vêm isoladamente, não retratam o que de fato foi a relação.
Precisamos buscar o desprendimento emocional para viver as experiências relacionais em sua totalidade. É difícil que tudo seja um mar de rosas. Se algo está bem, pode haver também o que não esteja. Como nós, nosso parceiro tem aspectos positivos e negativos, características que nos agradam ou desagradam.
O ponto crucial, nesse contexto, é saber o que prevalece.

* Célia Horta, psicóloga clínica na capital paulista, é mestre e doutora em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). E-mail: celiahorta@uol.com.br

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